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A Fonte

O que há de errado comigo ? Eu não sei nada e continuo limpo.

Que país é este ?

É o nosso.
Pobre país o nosso.
 
A crónica que se segue foi editada em livro em 1986, tendo sido inicialmente um artigo do "Expresso", pelo que podemos dizer que foi escrita à 20 anos.
 
E passados 20 anos, mudou alguma coisa ?
Agora que temos as bandeiras ao alto, (eu também), mudou alguma coisa ?
 
Como é possível que duas décadas depois a nossa "maneira de ser" continua a mesma ?
Quantas mais serão precisas ?
Alguém sabe?
 
 
CORRUPÇÃO
 
A CAUSA DAS COISAS
Miguel Esteves Cardoso
 
Assírio & Alvim
1986

A Anedota da semana não podia vir mais a jeito. A.NASA decide arranjar um astronauta europeu para ir a Marte. São seleccionados um inglês, um francês e um português. O primeiro a ser entrevistado é o inglês. Quando chega a altura de discutir a recompensa, o inglês pede nove milhões de dólares. O funcionário da NASA acha muito e quer saber porquê. O inglês explica que é casado, tem três filhos e que uma missão tão perigosa tem de ser devidamente paga. «Está bem, vamos ver”, diz o americano, mandando entrar o francês. O francês pede nove milhões de dólares. O entrevistador insiste em saber a razão de uma soma tão grande. O francês explica: «Está a ver - sou casado, tenho três filhos. Cinco milhões de dólares são para mim e para a minha família. E os outros quatro milhões de dólares são para dividir entre mim e as minhas duas amantes.»
Chega então a altura de entrar o português. Passa todos os testes e, mais uma vez o americano quer saber quanto é que o astronauta português quer cobrar. O português também pede nove milhões de dólares. Quando o americano lhe pede explicações, o nosso compatriota arregaça as mangas e avança com a resposta: «Ora bem... três milhões de dólares, para já, são para si, para o meu amigo me escolher a mim. E ficam seis. Três milhões de dólares são para mim. E os outros três milhões são para quem for a Marte, que se há-de arranjar alguém.»
Esta anedota ilustra perfeitamente a arte portuguesa de subornar. O suborno à portuguesa não é nada mefistofélico nem luciferino. É um esquema simpático entre amigos, em que «ganham todos». Não há chantagem nem culpa - é somente um contrato entre espertalhões, em que a única pessoa que se lixa é o terceiro, o desconhecido, ou o abstracto.Veja-se o caso flagrante dos exames de condução. O indivíduo que está tirar a carta entrega 15.000$00 ao seu instrutor. Este diz que dá o dinheiro ao examinador, mas é provável que fique com cinco contecos para ele, talvez para «compensar» ou «suavizar» a indignidade de ser um mero agente. Uma vez recebida a narta , o examinador não se limita a passar o candidato. Isso seria um suborno simples e logo pouco português. O que o examinador faz é facilitar o exame. Facilitar é, como se sabe, um dos desportos nacionais mais largamente praticados. O exame é então conduzido num clima de absoluta isenção de dificuldades. O examinador escolhe ruas interiores, sem trânsito, e vai dando instruções precisas ao candidato, tipo «Cuidado agora com esta passagem de peões. Abrande e olhe para os dois lados... meta uma terceira... isso... um cheirinho de travões... pois... sim senhor... é assim mesmo».
Se, por acaso, o candidato é tão inapto que nem assim consegue safar-se, o examinador não se sente constrangido a passá-lo, só pelo facto de ter recebido a «lembrança». Chumba-o sem pensar duas vezes «O meu amigo desculpe, mas isto não é a Feira Popular»). Devolve os quinze contos ao instrutor e diz que «fica para a próxima». É por isso que Portugal não é bem uma república das bananas. Numa república das bananas, entrega-se o dinheiro, recebe-se a carta, e está o negócio resolvido. Em Portugal é um pouco mais complicado. Faz-se sempre o exame, devidamente facilitado, e só se concede a carta de condução se o indivíduo preencher um mínimo de condições. Neste aspecto, Portugal é mais uma república de ananáses. O ananás sempre é um fruto mais luxuoso e mais complicado do que a banana.
Acontece, porém, que só uma terça parte dos examinadores está disposta a receber «luvas» (alguns acharão a percentagem pequena, mas sejamos optimistas). Os funcionários que recebem ficam ricos e são populares entre os instrutores, já que podem ser simpáticos, «gajos porreiros» e tudo o mais. Os colegas honestos, que contam apenas com o vencimento, sentem-se, com toda a razão, ressabiados. Vivem modestamente e ninguém gosta deles. A família chateia-o e chama-lhe parvo por não ser como os outros. É natural, por conseguinte, que compensem esta frustração com um excesso gigantesco de zelo. São de uma severidade debilitante e chumbam um candidato à mínima oportunidade. Ao primeiro arranhar de uma mudança, puxam do bloco, abanam o capacete, e mandam voltar às «boxes». «O melhor é o senhor habituar-se a andar de táxi.».
Chega-se assim a uma situação em que todos os exames são ou demasiado difíceis ou demasiado fáceis. O resultado final - a concessão de cartas de condução a indivíduos que saibam guiar - acaba por ser uma questão de sorte. No entanto, um condutor muito mau, mesmo que entre com a massa, nunca passa e um condutor muito bom, mesmo que «apanhe» um examinador «lixado», nunca chumba. Eis a diferença. Mas a grande maioria das pessoas que se apresenta a exame, não sendo nem muito boa nem muito má, está pura e simplesmente entregue ao destino. Portugal e uma república de ananáses porque existem, apesar de tudo, uns limites que não se encontram nas repúblicas somente de bananas, onde vale tudo. Ser muito bom ou muito mau em Portugal é igual a ser muito bom ou muito mau num país mais desenvolvido. O pior é quando se é outras coisas, como é mais frequente. Os mauzotes safam-se, os bonzitos lixam-se, os menos bons passam à frente dos menos maus e, embora raramente se chegue à bandalheira, anda-se tão perto dela quanto consente a lei da balda.
Quem se lixa com isto tudo, claro, é o Estado. Em Portugal, desde que seja o Estado a lixar-se, está tudo bem. No caso das cartas de condução, a quantidade de dinheiro necessário a fazer novo exame (à volta de sete contos) é apresentada como justificação destas injustiças todas. «Mais vale», nesta lógica, dar o dinheiro a um indivíduo concreto, com casa, família e preocupações, do que entregá-lo à «odiosa abstracção do Estado». Os portugueses são criaturas tragicamente concretas no que toca à transmissão de bens. Tanto mais que aqueles três indivíduos que participaram numa desonestidade (o instrutor, o examinador e o candidato) não só não se importam nada de estar a defraudar a república, como a culpam. E dizem com ar o mais inocente deste mundo: «Se não fossem tão gulosos e tão burocratas, isto não acontecia...»
O suborno à portuguesa é uma espécie de pequeno conluio contra o Estado, um acto concertado e pontual de desobediência civil. A corrupção em Portugal não é, salvo escandalosas excepções, um grandioso sistema de fraudes. É um somatório tremendo de incalculáveis pequenos golpes, praticados por pessoas diferentes em situações diferenciadas. É por isso que o nosso amigo Costa Braz tem tido tantas dificuldades. A corrupção entre nós nunca é «alta». Pelo contrário, é baixinha, atarracada, toda «por baixo da mesa e não se fala mais nisso». Se Costa Braz tivesse a ideia de prender os responsáveis, a única coisa que poderia fazer seria levantar uma cerca de arame farpado à volta de todo o território português. Todos os portugueses são culpados, porque todos nós participamos. Nada interessa que tenha sido «só daquela vez, para arranjar o apartamento», ou para conseguir a certidão mais depressa, ou para evitar chatices. Só não somos todos corruptos porque somos todos corruptinhos.

Por alguma razão quando se conta a anedota dos astronautas, a reacção mais habitual é julgar que «o português é que foi esperto». O mal de Portugal é esse. Somos todos demasiado espertos, o que não seria trágico, se o Estado não fosse tão estúpido. A burocracia convida os cidadãos a aldrabá-la, porque a alternativa à aldrabice é tão penosa, tão cara, tão morosa e tão chata. Quase se poderia dizer que a absoluta legalidade, entre nós, corrompe a alma. Depois, a burocracia é excessivamente artrítica para nos «apanhar» e, caso nos apanhe, para nos castigar. Com um Estado lento e estúpido e uma sociedade civil toda «pepe rápida» e espertalhaça, estão criadas as condições para o desenvolvimento livre e desenfreado do sistema português da aldrabice. É claro que ninguém quer, que ninguém gosta, mas também é verdade que, sendo assim, ninguém resiste.
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